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A Ressurreição de Lázaro: Reencarnação e a Vida Após a Morte


Por: Igor Silva Carneiro


Lázaro era irmão de Marta e Maria, que residiam em Bethânia, cidade perto de Jerusalém (essa família era muito amiga de Jesus). Jesus recebeu a notícia de que Lázaro havia morrido. Mas, Ele afirmou que esse acontecimento não era para a morte, mas para a Glória de Deus e, esperou alguns dias para se deslocar para Bethânia. Após dois dias, Jesus afirmou que Lázaro dormia, razão pela qual iria despertar o amigo. Jesus, em razão de sua Grandeza Espiritual, sabia que a morte não havia chegado ao amigo. Então, Jesus deu a ordem para que Lázaro saísse do túmulo, mesmo tendo ouvido que o nobre amigo cheirava mal. Após, Lázaro voltou à vida normal e foi perseguido pelos fariseus, pois foi considerado a prova viva daqueles que se recusavam a aceitar que Jesus era o Messias. (Capítulo XI, do Evangelho de João).

A ressurreição de Lázaro, conforme descrita no Evangelho de João, se trata de um relato tão fascinante que atravessa séculos, desafiando as noções da Humanidade sobre a vida e a morte. O Espiritismo, entre outras doutrinas, aborda profundamente essa passagem bíblica, questionando se o milagre foi literal ou se há uma explicação mais profunda e/ou espiritual por trás das manifestações relatadas.

Mas, afinal, o que define um milagre? É uma Intervenção Divina ainda desconhecida pela ciência, incapaz, assim, de explicar tais eventos extraordinários? E se Lázaro não ressuscitou fisicamente, o que significam os relatos de seu retorno à vida? Para muitos, é um relato de ascensão; para outros, uma metáfora profunda sobre o renascimento espiritual.

Os milagres, na acepção comum, são eventos que desafiam explicações simples, pois configuram ocorrências que transcendem as expectativas e conhecimentos humanos, desafiando a compreensão convencional da realidade. À medida que o conhecimento humano avança, eventos anteriormente considerados miraculosos perdem seu caráter extraordinário, pois passam a serem explicados e/ou reproduzidos, revelando Leis da Natureza até então desconhecidas, as quais indubitavelmente estão em harmonia com as Leis Divinas.

É importante ressaltar que o conceito de milagre está ligado à percepção e ao entendimento humano, podendo mudar conforme o progresso do conhecimento científico e espiritual. O que hoje parece inexplicável pode, no futuro, ser compreendido por meio de novas descobertas e desenvolvimentos da ciência, com o auxílio, inclusive, da Espiritualidade Maior.

Tal evento não se trata apenas de um episódio considerado milagroso, mas um portal para questionamentos profundos sobre a vida após a morte, a reencarnação e o poder transformador dos ensinamentos apresentados por Jesus.

De qualquer maneira, a discussão sobre a ressurreição de Lázaro não se limita ao âmbito religioso, mas alcança implicações profundas na vida cotidiana das pessoas, porquanto, promove a reflexão sobre a finitude da existência humana no ambiente material, o propósito da vida e o significado de morte. Assim, questiona-se: como é possível entender os eventos aparentemente milagrosos à luz da ciência e da Espiritualidade?

No contexto do Espiritismo, a passagem de Lázaro adquire uma nova dimensão, não apenas explorando a natureza dos milagres, mas também analisando como o evento pode ser interpretado à luz das Leis Naturais que regem o Universo. Para o Espiritismo, essa passagem transcende a mera narrativa, servindo como um ponto crucial de reflexão sobre a natureza dos milagres, o poder transformador da fé e as complexidades da existência.

Importante destacar que não se pretende contrariar as palavras constantes na Bíblia, mas apenas interpretar os acontecimentos à luz da Doutrina Espírita.

Significa dizer que, embora a Bíblia não forneça detalhes explícitos sobre o estado físico de Lázaro antes de receber a visita e a consequente ajuda de Jesus, a Doutrina Espírita oferece uma interpretação alternativa. Segundo essa visão, Lázaro não estava em um estado de morte definitiva, mas sim em um estado de letargia ou catalepsia. Essa explicação se baseia na compreensão espírita de que o laço entre o corpo e o espírito não havia sido rompido de forma completa.

Destarte, a ciência médica convencional reconhece e classifica condições como a catalepsia e a letargia, mas não demonstra um interesse significativo em seu tratamento, possivelmente por considerar que sua cura não está totalmente dentro de seu escopo. Em contraste, a ciência psíquica e a Doutrina Espírita não apenas reconhecem essas condições, mas também se dedicam intensamente ao seu estudo. Essas abordagens exploram a catalepsia e a letargia para extrair importantes ensinamentos e revelações sobre a natureza da alma humana. Através dessa investigação, essas disciplinas podem não só tratar e prevenir tais estados, mas também os induzir, manipulá-los e direcioná-los de maneira a obter conhecimentos profundos que podem contribuir para o avanço científico e transcendente em benefício da Humanidade. (PEREIRA, 1968. p. 9).

Assim, a letargia e a catalepsia são consideradas possibilidades que se encaixam na realidade fática interpretada pela Doutrina Espírita, sugerindo que a condição de Lázaro era uma suspensão temporária das funções vitais, e não a morte absoluta.

De tal maneira, a análise espiritual da ressurreição de Lázaro, à luz do Espiritismo, busca compreender os aspectos simbólicos e espirituais por trás do milagre descrito. Considera-se que a intervenção de Jesus Cristo libertou Lázaro de um estado de sofrimento biológico, espiritual e/ou de estagnação.

Segundo o Espiritismo, a ressurreição de Lázaro não se restringe a um evento histórico isolado, mas simboliza um profundo ensinamento espiritual. Para os Espíritas, essa passagem exemplifica não apenas a manifestação do Poder Divino, mas também a possibilidade de cura espiritual e renovação através da fé.

Além disso, a cultura da época em que os fatos ocorreram era significativamente diferente da atual, pois as pessoas eram sepultadas imediatamente após o falecimento, sem a realização de velórios, como é comum nos dias de hoje. Essa prática dificultava a verificação precisa para determinar se alguém realmente havia desencarnado ou se manifestava sintomas que poderiam erroneamente sugerir a morte do corpo físico. Quantas pessoas foram inadvertidamente sepultadas nessa condição? É certo que muitas!

Dizer que um evento miraculoso é inexplicável significa que, enquanto ele permanece sem uma explicação clara ou compreendida, sua origem e os mecanismos pelos quais ocorre não são conhecidos. No entanto, como dito, à medida que se adquire conhecimento sobre sua origem e como ele se reproduz, o evento pode deixar de ser considerado um milagre. Assim, quando se compreende plenamente o fenômeno e os fatores envolvidos, o que inicialmente parecia um milagre pode ser explicado por processos naturais ou científicos, diminuindo a percepção de sua natureza sobrenatural.

De qualquer maneira, “só o fato da reprodução de um fenômeno, em condições idênticas, basta para provar que ele é possível e se acha submetido a uma lei, não sendo, portanto, miraculoso” (KARDEC, 2013, p. 273).

No contexto de Lázaro, a vontade do Cristo e do seu especial magnetismo permitiu que o nobre amigo retornasse à vida, reintegrando o seu perispírito ao seu corpo físico, quando o laço perispirítico ainda não havia se rompido definitivamente. 

Aliás, a Doutrina Espírita, fundamentada nos ensinamentos de Allan Kardec, sugere que o magnetismo, ou fluido vital, é uma força fundamental que influencia a saúde e a vitalidade dos seres humanos. Jesus possuía um elevado grau de fluido magnético, um tipo de energia espiritual que transcende a compreensão material. Esse poder magnético é visto como uma capacidade de manipular e equilibrar energias vitais e espirituais, promovendo curas e intervenções que, à primeira vista, podem parecer milagrosas.

Assim, de acordo com os princípios espíritas, a vida não é meramente uma função biológica, mas está interligada a um campo espiritual que pode ser influenciado por forças magnéticas. Jesus, possuindo uma alta afinidade com essas forças, utilizou seu magnetismo para restaurar o equilíbrio espiritual e físico de Lázaro, demonstrando assim a aplicação prática da Lei Universal de Fluidos.

Evidentemente que Jesus poderia ter curado Lázaro à distância assim que soube de sua situação, de maneira que não precisaria esperar quatro dias para se dirigir ao túmulo onde seu amigo havia sido sepultado. Certamente, Ele pretendeu demonstrar que existia algo a mais que liga o Espírito ao Corpo: o perispírito.

Nesse diapasão, Jesus, ao optar por esperar quatro dias antes de se dirigir ao túmulo de Lázaro, não agiu por falta de poder, tampouco incapacidade de curar à distância. Segundo a Doutrina Espírita, essa decisão teve um propósito pedagógico e espiritual profundo. Ao esperar, Jesus demonstrou que a Intervenção Divina vai além da simples restauração da vida física. Ele pretendeu evidenciar a realidade e a importância do perispírito na manutenção da vida e da saúde.

Diante disso, surge a questão: é possível que uma pessoa que tenha falecido/desencarnado retorne ao corpo físico e retome sua vida corpórea? Isto é, após o rompimento definitivo do laço que conecta o Espírito ao corpo físico, é possível religar esse laço para que o indivíduo retorne à vida corpórea?

Para tanto, segundo o que consta no capítulo XV, itens 39 e 40 de A Gênese, o retorno à vida corpórea de uma pessoa que efetivamente tenha desencarnado é contrário às Leis da Natureza e, por conseguinte, miraculoso. Portanto, admite-se a ideia de que Lázaro, na realidade, não havia se desligado do corpo completamente. Do contrário, estar-se-ia afirmando que o próprio Jesus transgrediu as Leis da Natureza e/ou Divinas. (A Gênese, Cap. XV, p.294 e 295).

Essas informações fornecidas pelos Espíritos têm sido sustentadas por uma análise rigorosa e por consenso dentro da Doutrina Espírita, refletindo um entendimento profundo das Leis Naturais e Espirituais. Até o momento, os princípios divulgados nas obras básicas do Espiritismo não foram refutados mediante a apresentação de provas, e a interpretação de que a ressurreição física, tal como entendida em termos de retorno do mesmo corpo à vida, é miraculosa e contra as Leis da Natureza.

Em outras palavras, de acordo com a Doutrina Espírita, o evento descrito não representou a derrogação das Leis Divinas, uma vez que Lázaro não havia desencarnado, mas estava em um estado de catalepsia ou letargia profunda. Nessa visão, a condição de Lázaro se assemelha a uma suspensão temporária das funções vitais do corpo, onde o laço entre o corpo físico e o perispírito ainda não havia sido totalmente rompido. Portanto, quando Jesus o trouxe de volta à vida, o que ocorreu foi a restauração de uma condição de saúde e consciência que havia sido temporariamente enfraquecida.

Desta maneira, se Lázaro tivesse realmente morrido de forma definitiva, seu Espírito teria se separado completamente de seu corpo, e o retorno à vida física não seria possível sem uma nova reencarnação.

E, por que se deve assumir que as informações fornecidas pelos Espíritos, que desempenharam um papel na elaboração da Doutrina Espírita, são corretas? Em outras palavras, por que é necessário acreditar que os Espíritos têm razão ao afirmar que é impossível restabelecer a conexão entre o Espírito e um corpo considerado "morto"?

Uma das razões para acreditar nas palavras dos Espíritos é a consistência e a coerência das mensagens que foram recebidas por diferentes médiuns e em diferentes contextos. As informações transmitidas pelos Espíritos mostram uma unidade e uma harmonia que transcendem as diferenças individuais dos médiuns. Essa consistência nas respostas e a concordância com princípios éticos e morais Universais são vistas como evidências da veracidade das comunicações espirituais.

Aliás, a Doutrina Espírita enfatiza que as comunicações dos espíritos são influenciadas pelo nível moral e espiritual dos próprios Espíritos. Espíritos Superiores, que estão em um estado elevado de pureza e entendimento, transmitem mensagens que são edificantes e que promovem o progresso moral e espiritual. A sabedoria e a moralidade demonstradas nas mensagens dos Espíritos Superiores são vistas como um sinal da autenticidade e da relevância das comunicações.

Se não bastasse, o Espiritismo também é considerado uma doutrina em constante evolução e atualização. À medida que a compreensão espiritual e científica avança, os Espíritos continuam a fornecer informações que complementam e ampliam os ensinamentos anteriores. Essa capacidade de adaptação e desenvolvimento contínuo é vista como um indicativo de que as comunicações espirituais são verdadeiras e relevantes para o progresso da Humanidade.

Jesus, sendo um Espírito Superior, estava em plena sintonia com as Leis Universais que regem a criação e a vida. Sua compreensão profunda das Leis Naturais e Espirituais permitiu-lhe aplicar o magnetismo de maneira que respeitava e manipulava essas Leis de forma harmoniosa. Sua capacidade de realizar curas e milagres não era uma violação das Leis Naturais, mas uma demonstração de como essas Leis podem ser aplicadas em um nível elevado de compreensão e prática.

Aliás, no contexto do episódio da ressurreição de Lázaro, a declaração de Jesus, "Esta enfermidade não é para a morte, mas para a Glória de Deus," pode ser interpretada à luz de uma compreensão mais profunda da natureza da morte e da clarividência. Jesus fez esta afirmação para indicar que a condição de Lázaro serviria como um meio de revelar a Glória Divina, em vez de ser um fim definitivo.

Porém, muitos defendem a ideia de que Lázaro havia desencarnado, visto que Jesus foi a seu encontro quando estava sepultado há quatro dias, motivo pelo qual sugeriu-se que ele, inclusive, já cheirava mal, tal como sua irmã assim mencionou. 

Como Marta, irmã de Lázaro, teria conhecimento do estado de decomposição de seu irmão, descrito nos relatos bíblicos como "já cheirando mal"? Os eventos descritos na passagem sugerem que ela presumiu esse fato, pois a tumba estava completamente fechada por uma pedra, impedindo-a de obter certeza.

Evidentemente que a medicina traz histórias que corroboram a ideia da existência de letargias que possuem a capacidade de perdurar por oito ou mais dias, sendo certo que há situações em que o próprio corpo entra parcialmente em processo de decomposição, exalando mal cheiro, mesmo antes da morte.

Segundo a obra A Gênese, em certos estados patológicos, quando o Espírito se afasta do corpo e apenas alguns pontos do perispírito permanecem aderidos, o corpo apresenta todas as aparências da morte, indicando que a vida está por um fio. Esse estado pode perdurar por um período variável; algumas partes do corpo até podem entrar em decomposição, causando o mal cheiro, sem que a vida esteja definitivamente extinta. Enquanto o último vínculo não se rompe, o Espírito pode retornar ao corpo, seja por uma ação enérgica de sua própria vontade, seja pelo influxo de fluidos estranhos igualmente poderosos. Essa é a explicação para certos casos de prolongamento da vida contra todas as expectativas e algumas ocorrências supostas de ressurreição (KARDEC, 2013, it. 30, p. 260).

Portanto, ainda que se admita que Lázaro realmente cheirava mal, tal como sua irmã supôs, nota-se que tal situação não é de todo estranha, porquanto, é do conhecimento geral a possibilidade de pessoas que ainda se encontram encarnadas e, que chegam a exalar esse cheiro por conta da deterioração das extremidades do corpo, onde se verifica insuficiência de circulação e já se inicia o processo de necrose.

Dessa maneira, sob uma perspectiva espiritual, é possível reconhecer que Jesus utilizou seu poderoso magnetismo para infundir em Lázaro o fluido vital necessário. Esse ato fortaleceu os laços entre o Espírito de Lázaro e seu corpo, que estava enfraquecido pela letargia ou catalepsia profunda, resultando na restauração de sua saúde. Neste contexto, tudo se insere harmoniosamente dentro das Leis Divinas.

Inclusive, os próprios Espíritos, em resposta ao questionamento n° 424, de O Livro dos Espíritos, ensinam que a letargia e a catalepsia são curadas através do magnetismo, para refortalecer os laços entre o Espírito e o corpo físico, resultando na melhora da saúde (KARDEC, 2022, p. 183).

Entretanto, Lázaro, após ser ressuscitado por Jesus, não fornece relatos ou detalhes sobre o que teria experimentado durante os quatro dias em que esteve em estado de morte clínica. Esse silêncio é significativo e pode ser interpretado sob a perspectiva de que Lázaro não tenha passado por uma experiência consciente durante esse período, sugerindo que sua "morte" não envolveu um desligamento completo da consciência ou da alma do corpo. A ausência de relato pode indicar que, de fato, Lázaro estava em um estado de suspensão que não permitiu experiências ou memórias durante esse período.

Portanto, na Doutrina Espírita, entende-se que a passagem de Lázaro foi um fenômeno de cura. Admitir que, após o suposto completo desligamento do perispírito, Lázaro tenha retornado ao corpo, implicaria na ideia de que Jesus transgrediu uma das Leis Divinas. Por isso Jesus afirmou que essa enfermidade não levaria à morte, razão pela qual, segundo essa visão, Lázaro não havia desencarnado quando recebeu a visita de Jesus.

Um ponto de debate frequente é a aparente contradição nas palavras de Jesus, que inicialmente descreve Lázaro como estando "dormindo" (versículo XI) e, posteriormente, afirma que ele está "morto" (versículo XIV). Para os estudiosos do Espiritismo, essa questão oferece uma oportunidade para uma interpretação que harmonize e esclareça o significado dessas declarações.

De acordo com o Espiritismo, a descrição de Jesus sobre Lázaro estar "dormindo" deve ser entendida como uma metáfora para indicar que a alma de Lázaro estava apenas em um estado de transição, e não em um estado final de separação absoluta entre corpo e Espírito.

O Espiritismo ensina que a alma continua existindo e consciente, mesmo quando o corpo está em um estado de coma ou letargia profunda. Portanto, o uso do termo "sono" por Jesus pode ser visto como uma forma de mostrar que, do ponto de vista espiritual, Lázaro não estava em um estado definitivo de morte, mas apenas temporariamente afastado das atividades da vida física. Essa perspectiva é consistente com a ideia de que o verdadeiro estado de morte é a separação total entre o Espírito e o perispírito, e não apenas um estado de suspensão temporária das funções corporais.

Quando Jesus posteriormente declara que Lázaro está "morto", ele está reconhecendo a condição física aparente que os presentes observavam. A morte física, para aqueles que não têm compreensão espiritual mais profunda, é o que parece ser a condição final e absoluta. Assim, Jesus faz essa declaração para comunicar claramente o estado em que os observadores humanos encontravam Lázaro, preparando-os para o milagre que se seguiria.

A interpretação espírita resolve a aparente contradição ao demonstrar que as palavras de Jesus foram adequadas ao contexto e à compreensão dos ouvintes da época. O "sono" é uma metáfora para a condição da alma, indicando que, espiritualmente, Lázaro estava em um estado transitório. A declaração subsequente de que Lázaro estava "morto" refere-se à sua condição física observável, alinhando-se com a percepção humana da morte.

A história de Jesus e Lázaro, conforme narrado nos evangelhos, levanta questões profundas sobre a relação entre fé, tempo e resposta divina. Quando Jesus soube da doença de Lázaro, seu amigo querido, ele não se dirigiu imediatamente para curá-lo, o que certamente causou perplexidade e angústia entre aqueles que esperavam sua intervenção rápida. Este episódio oferece uma rica oportunidade para refletir sobre a natureza da confiança em Deus e o papel da paciência nas expectativas humanas.

Na experiência humana, frequentemente se espera que a Ajuda Divina ou as intervenções espirituais se manifestem de maneira imediata. Essa expectativa pode levar a frustração e até mesmo a sensação de abandono quando o auxílio não ocorre de acordo com o tempo desejado. A questão de por que Deus, ou o Divino, não responde prontamente é um tema recorrente na Espiritualidade e na prática religiosa. Muitos podem questionar por que o tempo de resposta não coincide com o tempo humano, gerando um sentimento de injustiça ou de desamparo.

O caso de Lázaro sugere uma lição importante sobre confiança e paciência. No contexto espiritual, a confiança em Deus envolve não apenas a crença na sua existência e bondade, mas também a aceitação de que Seus planos e tempos podem transcender a compreensão humana. A demora na resposta não necessariamente reflete negligência, mas pode ser parte de um propósito mais amplo e benéfico.

Além disso, a capacidade de esperar e manter a fé durante períodos de incerteza e sofrimento é um aspecto crucial do desenvolvimento espiritual. A paciência é vista como uma virtude que fortalece a confiança em um propósito maior e permite que as pessoas encontrem paz e significado, mesmo na ausência de respostas imediatas.

Nesse sentido, como pode a passagem de Lázaro ser relacionada à vida cotidiana do indivíduo? Quais ensinamentos benéficos essa passagem pode proporcionar para os desafios contemporâneos? Qual é o significado de Lázaro para cada ser humano? Como podem ser interpretadas as faixas que o envolviam e a gruta/caverna que o acolheu em relação à vida pessoal? Qual é a relevância do fato de Lázaro ter sido colocado no sepulcro para a compreensão atual da humanidade?

Emmanuel, na obra O Consolador, em resposta à questão n°. 317, ensina que o episódio de Lázaro constituiu um Símbolo Divino acerca da passagem de Jesus pela Terra, assim como da ação Dele sobre os indivíduos, de modo a demonstrar que o Seu amor retira a Humanidade do seu “sepulcro de misérias”. Quer dizer que o episódio de Lázaro foi um sinal importante da Presença Divina de Jesus na Terra. Ele simboliza como o amor de Cristo pode libertar a Humanidade de suas grandes dificuldades, mostrando através de suas ações que ele pode resgatar as pessoas desses momentos difíceis e guiá-las para uma vida melhor, através de seu ensinamento de amor e redenção no Evangelho. (EMMANUEL, 2008, p. 104).

Nesse aspecto, de acordo com o relato bíblico no Evangelho de João (capítulo 11, versículo 44), Lázaro, ao ser ressuscitado por Jesus, foi encontrado "afixado de mãos e pés com faixas, e o seu rosto estava envolto em um lenço.

A ideia de Lázaro estar envolto em faixas que impediam sua visão pode ser relacionada ao pensamento de que a visão limitada à dimensão material da vida impede o reconhecimento das alegrias encontradas nos níveis mais elevados de Espiritualidade. Assim como as faixas sobre os olhos de Lázaro representam uma restrição física, a preferência por viver nas "cavernas" dos valores transitórios reflete uma limitação espiritual. Essas "faixas" simbólicas impedem de enxergar a plenitude da vida, que transcende a experiência corporal atual e abrange uma dimensão maior de existência, onde as alegrias e significados são mais profundos e duradouros do que aquilo que causa sofrimento à humanidade encarnada.

A partir do Evangelho, é ensinado que Jesus remove as faixas que obstruem a compreensão plena da vida. A vida terrena não se limita à busca de prazeres efêmeros, acumulação de riquezas, títulos, fama ou poder, todos os quais podem representar "sepulcros" que restringem a visão espiritual e impedem o encontro da verdadeira felicidade.

A passagem de Lázaro ilustra a oportunidade de recomeço oferecida por Jesus. Para aqueles que enfrentam adversidades e erros, Ele proporciona conforto e esperança, possibilitando uma renovação com valores revigorados. Além disso, essa narrativa oferece reflexões sobre a condição humana após a morte, libertando-a do remorso, culpa e medo. Assim como Lázaro teve a chance de retornar à vida física, Deus oferece a oportunidade de a Humanidade se desvencilhar desses pesos espirituais.

No contexto contemporâneo, a história de Lázaro continua relevante ao destacar a possibilidade de transformação espiritual e renovação pessoal. Ela enfatiza que, apesar dos erros e desafios enfrentados, sempre existe a possibilidade de um novo começo em direção a uma vida mais plena e significativa, guiada por valores espirituais em vez de meras preocupações materiais passageiras. Portanto, cada indivíduo pode identificar-se com Lázaro, aspirando à libertação espiritual e à renovação interior proporcionadas pela mensagem de Jesus.

No relato bíblico, Jesus optou por permanecer por dois dias adicionais antes de se deslocar para ajudar Lázaro, o que gerou preocupações entre os apóstolos. Estes temiam retornar à Judeia devido ao perigo que haviam enfrentado anteriormente, quando Jesus quase foi apedrejado. Em resposta às preocupações dos apóstolos, Jesus destacou a importância de seguir um caminho iluminado, explicando que quem anda durante o dia não tropeça devido à presença da luz, ao passo que aqueles que caminham à noite enfrentam dificuldades por falta de iluminação.

No contexto contemporâneo, essas palavras ganham relevância significativa. A metáfora da luz e das trevas é utilizada para ilustrar a importância da presença de Jesus em nossas vidas. Aquele que se afasta de Jesus, alegando falta de tempo, e vive centrado apenas em seus próprios desejos e preocupações, é comparado a alguém que caminha nas sombras. Tal pessoa está mais propensa a tropeçar e se perder, uma vez que está sujeita às ilusões e enganos que caracterizam a escuridão espiritual.

Da mesma forma, Lázaro estava envolto em faixas e preso dentro de uma gruta ou caverna escavada na rocha, limitado por uma pedra que o impedia de sair e experimentar a vida plena fora de seu túmulo. A intervenção de Jesus, ao solicitar a remoção da pedra e chamá-lo para fora, representa a liberação espiritual e física de Lázaro, permitindo-lhe experimentar novamente a plenitude da vida.

A remoção da pedra pode ser interpretada como um convite para superar as barreiras que impedem a verdadeira abertura do coração humano. A pedra representa as defesas emocionais e espirituais que dificultam a prática da compaixão, da indulgência, do amor, da aceitação do planejamento divino e da confiança na fé. Ao pedir que a pedra fosse retirada, Jesus simbolicamente exorta o indivíduo a remover as obstruções que limitam a sua capacidade de viver conforme os valores espirituais e de conectá-lo profundamente com o Plano Divino.

É evidente que para muitos, a tarefa de remover a pedra é extremamente desafiadora. Ela exige um confronto direto com o próprio interior e um processo de autoexame que pode ser desconfortável e doloroso. Contudo, é apenas através dessa exposição e abertura que Deus pode agir de maneira eficaz. A metáfora da pedra é uma representação poderosa da necessidade de uma postura de coração aberto e disponível para que o amor e a Misericórdia de Deus possam se manifestar plenamente.

Portanto, a lição central é clara: a remoção da pedra é um processo essencial e desafiante que precede a Intervenção Divina. É um convite para que se abra espaço para que o poder de Deus atue, transformando o que parecia perdido e impossível em algo novo e pleno.

Após a remoção da pedra, Jesus realiza uma oração a Deus, sugerindo a importância de buscar a orientação e a conexão com o Plano Superior antes de tomar qualquer ação significativa em nossas vidas.

Dessa forma, a ressurreição de Lázaro, conforme narrada nos Evangelhos, pode ser compreendida como um processo de despertar espiritual que ocorre em três estágios distintos. Estes estágios, refletidos nas instruções de Jesus — “Tirai a pedra”, “Lázaro, sai para fora” e “Desligai-o, e deixai-o ir” — oferecem uma perspectiva valiosa sobre a transformação pessoal e a superação de limitações.

Aliás, ao observar o relato bíblico sobre a ressurreição de Lázaro, quando Jesus retorna à Judéia e encontra Marta, ela expressa a convicção de que, se Ele tivesse chegado antes, Lázaro não teria morrido. Em resposta, Jesus revela que Ele é a ressurreição e a vida, afirmando que aqueles que creem Nele, mesmo enfrentando a morte, continuarão a viver. Ele acrescenta que todo aquele que vive e crê nele não morrerá eternamente. Esta declaração transcende o contexto imediato da ressurreição de Lázaro e oferece uma perspectiva mais ampla sobre a natureza da vida e da fé. (Evangelho de João, capítulo 11, versículo 25-26).

Os problemas contemporâneos, como desigualdade social, injustiça, degradação ambiental, dentre tantos outros, podem ser vistos como as "pedras" que bloqueiam o caminho para um mundo melhor e mais justo. Assim como Jesus ofereceu a Lázaro a oportunidade de sair de seu túmulo e experimentar uma nova vida, a Humanidade também recebe o convite para remover as pedras que a aprisiona e a impede de buscar uma transformação pessoal e social.

Isso requer uma abertura para novas ideias, um questionamento das estruturas existentes e um compromisso com a construção de um futuro mais justo e sustentável para todos.

Jesus, ao se descrever como a "ressurreição e a vida," enfatiza a importância de uma transformação interior e espiritual. Ele se refere à renovação do Espírito e à vivência plena dos valores espirituais. A verdadeira ressurreição, portanto, envolve um compromisso com a cooperação mútua, a generosidade, a utilidade e a prática de uma vida de trabalho alegre e benevolente.

O processo de ressurreição espiritual, portanto, pode ser visto como uma jornada de transformação interior, onde a realização plena não advém das posses materiais ou das satisfações temporárias, mas da vivência de valores espirituais mais elevado

A reencarnação é um conceito central no Espiritismo, e a ressurreição de Lázaro pode ser vista como uma metáfora para a oportunidade de novos começos. A ideia de que Lázaro pode recomeçar sua vida com novos valores após a ressurreição reflete a crença espírita na possibilidade de renovação e melhoria. A vida é uma oportunidade para aprender, crescer e se aproximar da perfeição espiritual.

Esse entendimento amplia a perspectiva sobre a vida e a morte, sugerindo que a morte não é um fim, mas um novo começo em uma jornada de crescimento e aprendizado. A ressurreição de Lázaro, então, é vista não como uma violação das Leis Naturais, mas como um sinal do grande potencial de transformação e renovação que caracteriza o processo espiritual.

A ressurreição de Lázaro encoraja a busca por conhecimento e orientação espiritual. Em um mundo repleto de incertezas e desafios, a Doutrina Espírita sugere que a orientação espiritual e a compreensão das Leis Divinas são essenciais para encontrar a verdadeira paz e realizar mudanças positivas na vida.

O conceito de reencarnação e a ideia de renovação representadas na ressurreição de Lázaro podem motivar as pessoas a verem suas vidas como oportunidades contínuas de aprendizado e crescimento. Cada desafio e erro são vistos como oportunidades para evolução e melhoria espiritual, contribuindo para um futuro mais harmonioso e justo.

Assim, a experiência de Lázaro é vista como um símbolo poderoso de renascimento espiritual, representando uma oportunidade para a alma refletir, purificar-se e renovar-se.

No contexto atual, a ressurreição de Lázaro serve como um poderoso símbolo de esperança e transformação. Muitas pessoas enfrentam desafios significativos e crises pessoais que podem parecer comparáveis a um estado de "morte espiritual" — momentos em que se sentem perdidas, desalentadas ou em crise de fé. A história de Lázaro, à luz do Espiritismo, oferece uma perspectiva consoladora, sugerindo que mesmo nos momentos mais sombrios há potencial para renovação e crescimento.

Além disso, a Doutrina Espírita oferece uma visão do sofrimento e da morte que ajuda a mitigar o medo e a ansiedade associados a essas experiências. Ao entender que a morte física não é um fim absoluto, mas uma transição para uma nova fase da existência, os indivíduos podem enfrentar perdas e desafios com mais serenidade. A crença na continuidade da vida e no processo de reencarnação proporciona um sentido de propósito e um consolo profundo, ajudando as pessoas a lidar com a dor e a incerteza.

Portanto, a interpretação espírita da ressurreição de Lázaro oferece uma perspectiva enriquecedora que harmoniza a narrativa bíblica com a compreensão espírita da vida após a morte. A visão espírita reafirma a continuidade da vida e o papel da intervenção espiritual sem invalidar a crença na separação definitiva do corpo e do espírito que caracteriza a morte verdadeira. Assim, a história de Lázaro é vista como um poderoso exemplo de renovação e transformação espiritual dentro dos limites estabelecidos pela doutrina espírita.

Em última análise, a reflexão sobre a ressurreição de Lázaro e a reencarnação convida à compreensão da vida e da morte não como pontos finais, mas como partes de um ciclo contínuo de evolução espiritual. Essa visão oferece uma compreensão mais ampla e profunda sobre o propósito da existência e o caminho percorrido no plano espiritual. Assim, a ressurreição de Lázaro e a doutrina da reencarnação se entrelaçam, proporcionando uma visão mais rica e esperançosa da continuidade da vida além do plano material.

 

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Referências:

1- KARDEC, Allan, 1804–1869. A Gênese, tradução de Guillon Ribeiro da 5a ed. francesa. – 53. ed. 1. imp. – Brasília: FEB, 2013. 409 p.

2- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, tradução Guillon Ribeiro – 1ª edição dez. 2022 – Campos dos Goytacazes-RJ: Editora Letra Espírita. 384 p.

3- PEREIRA, Yvonne do Amaral. Recordações da Mediunidade (1900 – 1984) 1968 – Editora FEB. 2018.

4- XAVIER, Francisco Cândido. O Consolador - Ditada pelo Espírito: Emmanuel - Psicografada por: Francisco Cândido Xavier (primeira edição lançada em 1940). Brasília: Editora FEB. 2008.

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